19 fevereiro 2008

Carta à minha filhota

Olá filhota

Sei que não sabes ler. Sei até que só daqui a umas semanas é que vais ver a luz do dia, mas hoje o pai estava a falar com um amigo e dessa conversa saíu-me esta necessidade extrema de falar contigo a sério a primeira vez.

Talvez seja um bocado cedo para pensar nisto, mas eu já sei o que quero que tu sejas quando fores grande e porque não quero correr o perigo de ser mal interpretado, vou-te explicar o porquê do meu desejo.

Alguns papás projectam nos seus filhos o prolongamento da sua passagem efémera na vida. Por isso olham para os filhos como sendo a natural continuação daquilo que eles são e é exactamente isso que eu quero que tu sejas, a continuação de mim.

A esmagadora maioria das pessoas dirá que eu, nesse caso, quero que tu sejas designer, programadora, empresária, secretária, comerciante ou lá o raio que eu sou, que como a mãe já te deve ter dito, muda conforme as necessidades do dia-a-dia. Outros dirão que eu estava bem era com um bom emprego, como aquele que deitei fora e que isso é que era bom para ti. Esta maioria cega, surda e muda não entende que a extensão no futuro que os nossos filhos nos proporcionam não é, nem pode ser, a continuação de uma carreira.

Aquilo que eu quero que tu sejas e espero sinceramente que vá nos genes é insatisfeita e feliz e acredita que os dois são dificilmente compatíveis.

Não me interessa se vais liderar um voo a uma galáxia distante ou se vais lavar escadas. Desde que persigas insesantemente o teu lugar e a tua felicidade, por muita dor de cabeça que eu sei que isso me vai dar, eu estou e serei feliz.

É exactamente isso, sem mais nem menos que eu espero que seja em ti, o prolongamento de mim: a capacidade de agarrar o que a vida tem para te oferecer para no minuto seguinte, se necessário for, deitares para trás das costas desde que isso seja feito com o propósito de que cada dia que vives seja mais intenso e feliz do que o anterior.

Acredita no pai, amor. Estive no topo do mundo e no quinto dos infernos, mas sempre por opção minha, nunca por comodismo ou definição social.

Custou-nos muito ter-te aí na barriga da mãe e eu sei que se fizeres o que te estou a dizer, nos vai custar ainda mais alguns episódios, mas no fim, quando estiveres a escrever a tua carta ao teu filho vais saber, sentir e dizer-lhe: "Vai ser feliz, vais ver que vale a pena."

Um beijo
Pai

7 comentários:

Raistlin disse...

Fiquei inspirado. :)

Vlad disse...

Tu pá... não te inspires pá! Que eu ando a ler o livro do Ricardo Araújo Pereira e ele diz que os bébés são malvados!

Raistlin disse...

Não é inspiração para ter um bebé, é inspiração para definir e seguir o que me fará feliz! Imagino que chegue uma altura em que passe por aí mas agora estava mesmo a ser um bocado mais egoísta.

Vlad disse...

Ah! Percebi... não me importo nada que te inspires com as minhas blogadas de papá, desde que não me venhas pedir mesada, tasse! :)

clara neves disse...

Já és um GANDA PAI. Se a tua filha escrevesse, de certeza que era isto:
- Que FELIZ eu sou com este pai que me calhou!!!!

clara neves disse...

Só mais uma coisinha. Lembrei-me agora como é tão difícil descrever o que sentimos quando esperamos um filho. São tantos sentimentos!!!!!
Parabéns.

Bunny disse...

Lindissimo!
Fiquei arrepiada!